Júlio Resende em concerto: quando o jazz encontra o fado em liberdade
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Santa Comba Dão recebeu a criatividade inquieta de Júlio Resende no concerto Fado Jazz Ensemble, que transformou a Casa da Cultura, num território de liberdade e transcendência, levando o público a um estado de quase suspensão. E este encontro – menos provável - entre fado e jazz surgiu como uma experiência intensa, aberta e contemporânea.
Júlio Resende explorou a ideia de que o jazz é uma linguagem permeável, um território aberto ao diálogo com outras tradições e geografias, cruzando o improviso e o silêncio com a estrutura e o sentimento do fado. Há um entendimento profundo de que as duas linguagens partilham o mesmo impulso: a necessidade de expressar o que não se consegue dizer.
Em palco, Bruno Chaveiro na guitarra portuguesa, Elam Friedlander no contrabaixo e Alexandre Frazão na bateria e percussões constroem com Resende uma catedral sonora que acolhe múltiplas emoções e geografias. E é nas mãos de Bruno Chaveiro que a guitarra portuguesa prolonga e acrescenta o pensamento do pianista, enquanto Friedlander e Frazão erguem uma base rítmica assente tanto na contenção como na vitalidade.
Juntos percorrem latitudes sonoras - do sul quente e ritmado à melancolia da bruma açoriana - passando por reminiscências de África e por memórias do fado lisboeta.
Em concerto, a viagem faz-se por músicas de quatro álbuns (dos oito editados) por Júlio Resende – da Alma, Cinderella Cyborg, Fado Jazz Ensemble e Filhos da Revolução - numa fusão natural entre tradição, improviso e memória coletiva.
Em “Fado Blues”, “Este Piano não te esquece” e “Fado Cyborg” promove-se o encontro entre o sentimento fadista e a liberdade do jazz.
“Lira”, tema baseado numa canção tradicional açoriana, revela a capacidade de Júlio Resende em reinventar sonoridades coletivas.
Com “Vira Mais Cinco”, escrito em compasso 5/4, Resende faz um trocadilho e uma homenagem a Zeca Afonso. Sobre este tema, o músico explica: “É uma espécie de Vira, para virar a música ao contrário, de pernas para o ar, como quem faz o pino. E o Zeca também procurou virar a mesa, virar para o lado melhor o mundo em que vivia.”
“Filhos da Revolução”, tema homónimo do álbum de 2023, reforça esta dimensão simbólica: celebra os 50 anos do 25 de Abril e a relação de Portugal com África, lembrando que a música pode ser simultaneamente uma experiência estética, um território de liberdade e uma ponte com a história e a memória.
Depois do Lisbon Underground Music Ensemble, o 17.o Festival de Música e Artes do Dão (FMAD) trouxe novamente ao palco um dos mais destacados músicos contemporâneos portugueses. Júlio Resende - que colaborou, em vários projetos, com Salvador Sobral - trilha caminho próprio, com uma linguagem musical demarcada, inovadora e profundamente enraizada na tradição portuguesa. O FMAD é promovido pela Associação de Música e Artes do Dão e pelo Conservatório de Música e Artes do Dão, com financiamento da Direção-Geral das Artes e apoio do Município.
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